Manoel Cândido Pinto de Oliveira - nascido no Porto, freguesia da Cedofeita, a 11 de Dezembro de 1908, e falecido no Porto, freguesia da Foz, a 2 de Abril de 2015 - foi o mais importante e internacional cineasta português. Era, à data da sua morte, o mais velho realizador do mundo em actividade e o mais velho de sempre com a mais longa carreira da história do cinema, com uns notáveis 88 anos ao seu serviço. É autor de trinta e duas longas-metragens.
Biografia
Manoel de Oliveira (pronúncia em português europeu mɐnuˈɛɫ doliˈvɐjɾɐ) nasceu na freguesia de Cedofeita na cidade do Porto, no seio de uma família da alta burguesia nortenha, com origens na pequena fidalguia rural. Foi registado como Manoel, mas a revisão ortográfica da I República mudou-lhe a grafia do nome para Manuel. Voltou a assinar "Manoel" no final dos anos 70.
É filho de Francisco José de Oliveira (Mosteiro, Vieira do Minho, 1865 - ?), industrial e primeiro fabricante de lâmpadas em Portugal, e da sua mulher Cândida Ferreira Pinto (Santo Ildefonso, Porto, 13 de abril de 1875 - Porto, 2 de julho de 1947). Os seus pais casaram-se na freguesia de Lordelo do Ouro, na cidade do Porto. Tinha dois meios-irmãos, de uma relação do pai anterior ao casamento.
Ainda jovem, foi para A Guarda (Ex La Guardia), na Galiza, onde frequentou um colégio de jesuítas. Admite ter sido sempre mau aluno. Dedicou-se ao atletismo, tendo sido campeão nacional de salto à vara e atleta do Sport Club do Porto, um clube de elite. Segui-se o automobilismo e a vida boémia no Café Diana, Póvoa de Varzim, com os amigos José Régio, Agustina Bessa-Luís, Luís Amaro de Oliveira, João Marques e outros. Cedo se interessou pelo cinema, o que o levaria a frequentar a escola do cineasta italiano Rino Lupo, quando este se radicou no Porto.
Manoel de Oliveira faleceu na madrugada do dia 2 de abril de 2015, às 11:30, vítima de paragem cardíaca. Considerado o realizador mais velho do mundo em actividade, foi o único que assistiu à passagem do mudo ao sonoro e do preto e branco à cor. Confessou, numa entrevista ao jornal Diário de Noticias: "Para mim é pior o sofrimento do que a morte. Pois a morte, é o fim da macacada".
Conseguiu concretizar o seu último desejo: "continuar a fazer filmes até à morte". Era tratado por muitas pessoas como "O Mestre".
Família
Manoel de Oliveira casou no Porto, a 4 de Dezembro de 1940, com Maria Isabel Brandão de Meneses de Almeida Carvalhais (nascida no Porto, a 1 de Setembro de 1918). Dessa relação nasceram quatro filhos: Manuel Casimiro Brandão Carvalhais de Oliveira (nascido em 1941), José Manuel Brandão Carvalhais de Oliveira (nascido no Porto, freguesia de Santo Ildefonso, a 4 de Junho de 1944), Isabel Maria Brandão Carvalhais de Oliveira (nascida no Porto, freguesia de Santo Ildefonso, a 29 de Junho de 1947, Adelaide Maria Brandão Carvalhais de Oliveira (nascida no Porto, freguesia de Santo Ildefonso, a 10 de Outubro de 1948), casada com Jorge Manuel de Sousa Trêpa (Santo Tirso, 19 de Março de 1943). Teve também vários netos e bisnetos. Um dos netos é o actor Ricardo Trêpa (filho de Adelaide) que entrou em vários filmes do avô.
Carreira
Aos 20 anos, vai para a escola de actores fundada no Porto por Rino Lupo, o cineasta italiano ali radicado, um dos pioneiros do cinema português de ficção. "Berlim: sinfonia de uma cidade", documentário vanguardista de Walther Ruttmann, influencia-o profundamente. Tem então a ideia de rodar uma curta-metragem sobre a faina no Rio Douro, o seu primeiro filme. "Douro, Faina Fluvial" (1931), estreado em Lisboa, suscita a admiração da crítica estrangeira e o desagrado da nacional. Seria o primeiro documentário de muitos que abordariam, de um ponto de vista etnográfico, o tema da vida marítima da costa de Portugal, tal como "Nazaré, Praia de Pescadores" (1929) de Leitão de Barros (misto de ficção e documentário), "Almadraba Atuneira" (1961) de António Campos ou "Avieiros" (1976) de Ricardo Costa.
Mantendo o gosto pela representação, participa como actor no segundo filme sonoro português, "A Canção de Lisboa" (1933), de Cottinelli Telmo. Diria mais tarde não se identificar com aquele estilo de cinema popular. Em 1942, aventura-se na ficção com a adaptação ao cinema do conto "Os Meninos Milionários", de João Rodrigues de Freitas e filma "Aniki-Bobó" (1942), retrato de infância no ambiente cru e pobre da Ribeira do Porto. O filme é um fracasso comercial, mas, com o tempo, dará que falar. Oliveira decide, talvez por isso, abandonar outros projetos, envolvendo-se em negócios da família. Só voltará ao cinema, catorze anos depois, com "O Pintor e a Cidade" (1956), em que filma a cores. A fim de adquirir os conhecimentos necessários para tal experiência, faz uma curta formação nos estúdios da Agfa-Gevaert AG na Alemanha de Leste.
Em 1963, realiza "O Acto da Primavera" (segunda docu-ficção portuguesa), filmando uma peça de teatro popular e iniciando uma nova fase do seu percurso. Com este filme, praticamente ao mesmo tempo que António Campos, envolve-se na prática da antropologia visual no cinema. Essa prática seria amplamente explorada por cineastas como João César Monteiro, na ficção, António Reis, Ricardo Costa e Pedro Costa, no documentário. "O Acto da Primavera" e "A Caça" são obras marcantes na carreira de Manoel de Oliveira. O segundo filme, uma curta-metragem de ficção, é interrompido para conseguir fazer bem o primeiro, incursão no documentário, trabalhado com técnicas de encenação. Certo atrevimento vale-lhe a supressão de uma cena por parte da censura. Mais ainda: por causa de alguns diálogos inconvenientes, fica dez dias nos calabouços da PIDE, onde conhece Urbano Tavares Rodrigues.
A obra cinematográfica de Manoel de Oliveira, até então interrompida por pausas e por projetos gorados, só a partir da "O Passado e o Presente" (1971) prosseguirá, sem quebras nem sobressaltos, por uns trinta anos, até para lá do final do século. A teatralidade imanente de "O Acto da Primavera", contaminando esta sua segunda longa-metragem de ficção, afirmar-se-ia como o seu estilo pessoal, como forma de expressão que Oliveira achou por bem explorar nos seus filmes seguintes, apoiado por reflexões teóricas de amigos e firmes convicções de conhecidos comentadores.
A tetralogia dos amores frustrados seria, por excelência, o "campus" de toda essa longa experimentação. O palco seria o plateau, o espaço cénico onde o filme falado, em «indizíveis» tiradas, se tornaria a alma do espectáculo: o puro cinema submetido ao teatro, sua referência, sua origem, seu fundamento, tal como Oliveira o vê. Eram assim ditos os amores, ditos eram os seus motivos, e ditos ficaram os argumentos do invicto «Mestre» e de quem nisso viu toda a sua originalidade. Amores ditos e escritos, com muito palavreado, com muito peso: sem nenhuma emoção mas sempre com muito sentimento.
Em 1982 Manoel de Oliveira faz um documentário auto-biográfico de confissões e memórias. O cenário é a casa onde viveu desde 1940. O filme só será exibido depois da sua morte. Insiste em dizer que só faz filmes pelo gozo de os fazer, indiferente às críticas mais negativas. Levou entretanto uma vida retirada, longe das luzes da ribalta.
Os seus actores preferidos, com quem manteve uma colaboração regular, eram Luís Miguel Cintra, Leonor Silveira, Diogo Dória, Isabel Ruth, Miguel Guilherme, Glória de Matos e, mais recentemente, o seu neto, Ricardo Trêpa. Não lhe eram, de modo algum, indiferentes actores estrangeiros como Catherine Deneuve, John Malkovich, Marcello Mastroianni, Michel Piccoli, Irene Papas, Chiara Mastroianni, Lima Duarte ou Marisa Paredes que com ele trabalharam.
Em 2008, completou 100 anos de vida. Dotado de uma resistência e saúde física e mental notáveis, era frequentemente enaltecido, nas referências que lhe eram feitas, como «o mais velho realizador do mundo em atividade».
Deixou três projetos sem filmar: a longa-metragem "A Igreja do Diabo", que teria os actores Fernanda Montenegro e Lima Duarte no elenco, "A Ronda da Noite", baseado em Agustina Bessa-Luís e um projecto sobre o papel das mulheres nas vindimas, que seria a sua próxima rodagem.
O teatro e o cinema
A obra de Manoel de Oliveira é marcada por duas tendências opostas presentes em toda a sua filmografia. Em todos os filmes que realizou antes de 1964, curtas e longas-metragens, incluindo "Aniki-Bobó" (1942) e "A Caça" (1964) predomina um estilo cinematográfico puro, sem diálogos ou monólogos palavrosos. "O Acto da Primavera" (1963) é o primeiro filme de Oliveira em que o teatro filmado se torna uma opção e um estilo. "O Passado e o Presente" (1972) será o segundo. Contradizendo-se na prática, é a propósito deste filme que ele se explica em teoria: enquanto arte cénica, o teatro é bem mais nobre e muitíssimo mais antigo que o cinema e é por isso que este se deve submeter à palavra.
A esta dualidade de Manoel de Oliveira não é estranha a sua educação religiosa. É católico por crença e convicção, mas de ortodoxo nada tem. A dúvida quanto ao corpo da fé, quanto a certos princípios da sua igreja, assola-o com frequência e isso tem reflexos profundos na sua obra. Essa dúvida é reproduzida no frequente filosofar de muitas das personagens dos seus filmes, em particular nos filmes mais falados, com incarnação de figuras do Evangelho e do ideário cristão, com inúmeras referências bíblicas.
Por muitos anos o teatro filmado, salvo raras exceções, será na obra de Manoel de Oliveira opção dominante, que se extrema com "O Sapato de Cetim" (1985). Na passagem da década de oitenta para noventa essa tendência atenua-se. Monólogos e diálogos são cantados em "Os Canibais" (1988), o teatro converte-se em ópera, a palavra deixa de ser crua para ser cantada. Pouco depois, o teatro surge em doses equilibradas com o cinema em "A Divina Comédia" (1991). Gradualmente e a partir de então, o estilo cinematográfico volta a predominar na cinematografia de Oliveira com filmes mais leves e de menor duração. É de admitir a hipótese de tal se dever, por força das circunstâncias, à necessidade de fazer filmes num formato que não afaste o público, talvez também pela nostalgia dos primeiros filmes que fez.
O seu nome consta da lista de colaboradores da revista de cinema Movimento (1933-1934) e também se encontra colaboração artística da sua autoria na Mocidade Portuguesa Feminina: boletim mensal (1939-1947).
Filmografia
Longas-metragens
1942 - Aniki-Bobó
1963 - Acto da Primavera (docuficção)
1972 - O Passado e o Presente
1974 - Benilde ou a Virgem Mãe
1979 - Amor de Perdição
1981 - Francisca
1985 - Le Soulier de Satin (Sapato de Cetim)
1986 - O Meu Caso
1988 - Os Canibais
1990 - Non, ou a Vã Glória de Mandar
1991 - A Divina Comédia
1992 - O Dia do Desespero
1993 - Vale Abraão
1994 - A Caixa
1995 - O Convento
1996 - Party
1997 - Viagem ao Princípio do Mundo
1998 - Inquietude
1999 - A Carta
2000 - Palavra e Utopia
2001 - Porto da Minha Infância
2001 - Vou para Casa
2002 - O Princípio da Incerteza
2003 - Um Filme Falado
2004 - O Quinto Império - Ontem Como Hoje
2005 - Espelho Mágico
2006 - Belle Toujours
2007 - Cristóvão Colombo – O Enigma
2009 - Singularidades de uma Rapariga Loura
2010 - O Estranho Caso de Angélica
2012 - A Igreja do Diabo
2012 - O Gebo e a Sombra
Curtas e médias metragens
1931 - Douro, Faina Fluvial
1932 - Estátuas de Lisboa
1938 - Já se Fabricam Automóveis em Portugal
1938 - Miramar, Praia das Rosas
1941 - Famalicão (filme)
1956 - O Pintor e a Cidade
1964 - A Caça
1965 - As Pinturas do meu irmão Júlio (documentário)
1966 - O Pão (documentário)
1982 - Visita ou Memórias e Confissões
1983 - Lisboa Cultural
1983 - Nice - À propos de Jean Vigo
1985 - Simpósio Internacional de Escultura em Pedra - Porto
2007- Manoel de Oliveira - Rencontre unique
2010 - Painéis de São Vicente de Fora, Visão Poética
2011 - "Do Visível ao Invisível" em Mundo Invisível
2014 - O Velho do Restelo
Outros filmes
1937 - Os Últimos Temporais: Cheias do Tejo (documentário)
1958 - O Coração (documentário, 1958)
1964 - Villa Verdinho: Uma Aldeia Transmontana (documentário)
1987 - Mon Cas (1987)
1987 - A Propósito da Bandeira Nacional (1987)
2002 - Momento (2002)
2005 - Do Visível ao Invisível (2005)
2006 - O Improvável não é Impossível (2006)
2011 - O Conquistador conquistado (2011), curta-metragem inspirado pela escolha de Guimarães como Capital Europeia da Cultura..
Outras atividades
Como actor
1928 - Fátima Milagrosa, de Rino Lupo
1933 - A Canção de Lisboa, de Cotinelli Telmo
1980 - Conversa Acabada, de João Botelho
1981 - Cinématon #102, de Gérard Courant
1994 - Lisbon Story, de Wim Wenders
Como supervisor
1966 - A Propósito da Inauguração de Uma Estátua - Porto 1100 Anos, de Artur Moura, Albino Baganha e António Lopes Fernandes.
1970 - Sever do Vouga… Uma Experiência, de Paulo Rocha
Como piloto de automóveis
Uma Carreira que durou entre 1935 e 1938, "entre a serenidade absoluta e o arrojo sem par".
Prémios e galardões
Comendador da Ordem Militar de Sant'Iago da Espada (9 de Junho de 1980)
Grã-Cruz da Ordem Militar de Sant'Iago da Espada (29 de Dezembro de 1988)
Doutor honoris causa pela Universidade do Porto / Faculdade de Arquitectura (1989)
.
Foi professor honorário da Academia de Cinema de Skopje.
Prémio Europa David Mourão-Ferreira 2006 (categoria Mito), entregue pelo Centro Studi Lusofoni - Cátedra David Mourão Ferreira da Universidade de Bari e do Camões, Instituto da Cooperação e da Língua
Prémio de Cultura Padre Manuel Antunes 2007, Palavra de D. Manuel Clemente durante o acto de entrega do Prémio a Manoel de Oliveira
Recebeu em 2008 o Prémio Mundial do Humanismo
Em 2008 Manoel de Oliveira recebeu o Doutoramento honoris causa pela Universidade do Algarve
Grã-Cruz da Ordem do Infante D. Henrique (13 de Dezembro de 2008)
Em 2009 recebeu nos XIV Globos de Ouro, transmitido na SIC no dia 18 de Maio de 2009, um prémio de prestigio e de homenagem pelo trabalho que realizou, tendo já 100 anos de idade e sendo dos realizadores mais velhos do mundo.
Em 2010 recebeu o Prémio da Igreja Católica «pelo seu "falar de Deus"»
Em 2011 recebeu o doutoramento honoris causa pela Universidade de Trás-os-Montes e Alto Douro.
Em 2013, recebeu a Medalha de Conhecimento e Mérito do Instituto Politécnico de Lisboa.
Lista de prémios no estrangeiro (em francês), Ciné-Ressources, BIFI, Cinemateca Francesa
Em 2014, recebeu do presidente François Hollande, o título de Grande-Oficial da Ordem Nacional da Legião de Honra, atribuída pelo governo da França às personalidades influentes no cenário global ligadas ao país.
Nota: o presente texto é uma adaptação de outros documentos constantes na Wikipedia e na IMDB.
T O P F I V E (Recomendado)
1942 - Aniki-Bobó
1979 - Amor de Perdição
1988 - Os Canibais
1990 - Non, a vã glória de mandar
1993 - Vale Abraão
Sem comentários:
Enviar um comentário